Elon Musk e outros quatro multimilionários já perderam mais de metade do PIB de Portugal ao lado de Trump. Agora só eles o podem travar
14-03-2025
Depois da eleição de Trump, ganharam muito. Depois da sua tomada de posse, começaram a perder. A cada vez que o presidente norte-americano fala, adensando a guerra comercial, há retaliação. Mesmo acumulando perdas, há um horizonte que pode alimentar a sua inação: se a Europa ceder a Trump, os ganhos poderão ser tremendamente maiores
Imagine que Portugal perdia mais de metade da riqueza que produz todos os anos. Foi exatamente uma perda nessa escala que tiveram cinco multimilionários que marcaram presença na tomada de posse de Donald Trump. Apesar dos ganhos iniciais por estarem associados ao novo presidente dos Estados Unidos da América, a verdade é que nas últimas semanas têm acumulado perdas.
Ultrapassa já os 209 mil milhões de dólares – o equivalente a 192 mil milhões de euros, um valor que representa 67% da riqueza que é produzida em Portugal todos os anos – o valor de perdas acumuladas por Elon Musk, Jeff Bezos, Sergey Brin, Mark Zuckerberg e Bernard Arnault, segundo contas da Bloomberg Billionaires Index.
Resultado de uma política protecionista e de uma guerra comercial, de efeitos imprevíveis, que, segundo os economistas, politólogos e especialistas em relações internacionais ouvidos pela CNN Portugal, podem resultar num “travão” no apoio que estes multimilionários têm dado a Trump.
Mas todos concordam que essa inversão não deverá ser uma realidade no curto prazo. Por dois motivos: a grande capacidade das gigantes tecnológicas de absorver as perdas e a sua esperança de que, da guerra comercial, possa resultar para elas um contexto mais favorável, que fará disparar o negócio.
Elon Musk e a “tentativa desesperada” de contrariar os “danos reputacionais”
“Trump goza de um estado de graça, mas isto pode ser o início do seu desgaste”, aponta José Palmeira, professor de ciência política na Universidade do Minho.
Nesta fase, o multimilionário que mais perdeu é, precisamente, aquele que mais tem estado colado a Trump: Elon Musk, que até tem um cargo na administração norte-americana, à frente do recém-criado Departamento de Eficiência Governamental (DOGE). O dono da Tesla viu o valor das ações praticamente duplicar depois das eleições. Contudo, o cenário inverteu-se, com perdas na ordem dos 148 mil milhões de dólares depois da tomada de posse.
As vendas estão a cair em vários países – sobretudo na Europa, onde se critica o seu alinhamento à extrema-direita, evidente nas últimas eleições alemãs. E há quem ponha autocolantes nos carros que já tinha comprado para vincar como se afasta dos atuais ideais do empresário.
Perante estes “danos reputacionais”, Trump acabou a promover um Tesla na Casa Branca. “É uma tentativa desesperada de contrariar as coisas”, resume Orlando Samões, especialista em relações internacionais do Instituto de Estudos Políticos da Universidade Católica Portuguesa. “As pessoas tendem a penalizar essas figuras [multimilionários] por considerarem excessiva a aproximação ao poder”.
Elon Musk com Donald Trump (Jim Watson/AFP/Getty Images)
Haverá “ponto de saturação”
Mas poderão as perdas sentidas pelos multimilionários próximos de Trump funcionar como o travão a uma política económica que muitos definem como uma loucura? Os analistas ouvidos pela CNN Portugal admitem que sim.
“Acredito que estas pessoas, quando virem os lucros das suas empresas a cair, vão chamar à atenção o próprio presidente”, reage Ricardo Ferraz, economista e professor no ISEG e na Universidade Lusófona.
“Pode levar a um ponto de saturação, a um descontentamento desses setores, levando-os a afastar-se [da associação a Trump e da sua política]”, junta José Palmeira.
“Podem vir a aconselhá-lo de outra maneira”, resume Orlando Samões, perante o facto de se terem perdido as vantagens esperadas com a aproximação ao poder.
Um horizonte que leva à inação
A verdadeira dúvida é perceber se e quando acontecerá o tal “ponto de saturação”. Para quem está habituado a olhar para a economia e para a política internacional, não é algo que devamos esperar em breve.
“Estes multimilionários já deviam estar à espera de que a guerra comercial trouxesse perdas. Não são assim tão revelantes se se materializarem durante um, dois, três anos”, começa por dizer o economista Filipe Grilo, docente da Porto Business School.
Há no horizonte, continua, consequências da guerra comercial que poderão trazer benefícios bem maiores. “A política de Trump será pôr a Europa a negociar outro tipo de condições”. Quais? Reduzir a regulação e a carga fiscal que têm ensombrado a presença das tecnológicas americanas no Velho Continente.
“Do ponto de vista dos multimilionários, estão a pensar mais nos efeitos a longo prazo. Esperam que, no final da guerra comercial, acabem a ganhar coisas que não estão ainda sequer a ser negociadas”, remata Filipe Grilo.
Mark Zuckerberg, Jeff Bezos, Sundar Pichai e Elon Musk todos juntos numa fotografia (Julia Demaree Nikhinson, Pool/AP)
O problema são os outros
Elon Musk, dono da Tesla, perdeu 148 mil milhões de dólares. Jeff Bezzos, da Amazon, 29 mil milhões. Sergey Brin, antigo presidente da Alphabet, dona da Google, outros 22 mil milhões. Para Mark Zuckerberg, dono da Meta, que controla o Facebook e o Instagram, foram cinco mil milhões. O mesmo valor que perdeu Bernard Arnault, dono da LVMH, que detém as marcas Louis Vuitton ou Dior. Estiveram todos na tomada de posse de Donald Trump. E estarão a colher os frutos dessa “proteção” que procuraram junto do poder.
Para Orlando Samões, estas dinâmicas no mercado “são um bom sinal”, de que ele continua a funcionar de forma regular, “com os valores das empresas a flutuar de acordo com os interesses das pessoas”.
“Quem está preocupado com a desregulação no mercado de ações é mesmo o americano comum, que investe muito mais do que o português comum. Vai sentir que as suas poupanças estão em risco”, aponta Filipe Grilo.
A preocupação dos especialistas ouvidos pela CNN Portugal está em todas as outras empresas que vão sentir os impactos da guerra comercial – uma vez que estão dependentes de matérias-primas estrangeiras onde se vão aplicar tarifas – e, em última instância, no consumidor comum.
“Estes multimilionários estão a pagar a fatura, como todas as empresas americanas que importem matérias-primas, porque vão acabar por sofrer da resposta que os outros países vão dar aos EUA”, aponta Ricardo Ferraz.
“E os próprios trabalhadores, porque se as empresas são afetadas, isso sente-se nos níveis de emprego, nos salários, na perda de poder de compra perante produtos que ficaram mais caros com essas tarifas e com a inflação”, junta José Palmeira.
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Wilson Ledo